Fórum de Discussão: o retorno a uma utopia realizável - a Universidade do Minho como projecto aberto, participado, ao serviço do engrandecimento dos seus agentes e do desenvolvimento da sua região

quarta-feira, dezembro 01, 2010

O Ensino Básico e Secundário e a Crise em Portugal em 2010 - segunda parte

3 - CONTINUA INSTITUÍDA UMA CULTURA DE “FACILITISMO” EM VEZ DE UMA CULTURA DE TRABALHO E MÉRITO DESDE O 1º AO 12º ANOS.
Até há poucos anos, não havia programas de Ensino até ao 4º ano (antiga 4ª classe). Os professores davam, quando davam, o que entendiam. As Escolas funcionavam essencialmente como infantários ou “depósitos” de crianças que os Pais as iam levar de manhã e buscar ao meio dia ou à tarde. Daí que os meus netos saídos do 4º ano só soubessem fazer uma conta de somar com duas parcelas e dificilmente uma conta de diminuir ! A tabuada, nem pensar nela era bom... As crianças deviam brincar... Quando muito, os estudos deveriam ser mais uma brincadeira, como outros jogos próprios da idade – daí a distribuição de computadores aos alunos da Primária, onde o aluno para fazer uma soma entra com as parcelas que caem do “céu” e aparece a soma feita (!), quando desde a 1ª classe se devia dizer que estudar é trabalhar e para brincadeira bastam os períodos de “recreio” nos intervalos das aulas.
E a ideia de que o estudo deve ser uma brincadeira, segundo os cânones dos “sábios” do MEN, continua até ao 12º ano. Vejamos os títulos dos manuais escolares, por exº o dos manuais de “Língua Portuguesa”: “Nas Asas da Fantasia”; ou o de matemática do 12º ano: “X€QMAT” . E a brincadeira continua dentro dos manuais e nos textos das próprias provas de exame de matemática que vêm do MEdu.: a 1ª questão da prova escrita de física e química – A 2006.F2v1 reza assim:
“1. Leia atentamente o texto seguinte:
Há 10 ou 20 mil milhões de anos sucedeu o Big Bang, o acontecimento que deu origem ao nosso Universo...”.
No 12º ANO (!) continua-se no reino da Fantasia, mas agora com consequências traumatizantes para muitos alunos. No interior dos manuais, nos trabalhos para casa e nos próprios pontos de exame incluem-se perguntas que incidem sobre uma banda desenhada! É ou não verdade que esses “sábios” do MEN entendem que o ensino não deve ser coisa muito séria, mas sim uma fantasia, por vezes muito caprichosa, mas sem qualquer relação com a vida que o aluno(a) vai enfrentar amanhã?.

4 - O PROGRAMA DE CADA DISCIPLINA NÃO ESTÁ CONCEBIDO DE FORMA A O(A) ALUNO(A) ASSIMILAR FACILMENTE OS FUNDAMENTOS DA CIÊNCIA EM CAUSA?
Por exº, os programas da disciplina de Físico-Químicas do 7º. ao 9º e de Física e Química do 10º ao 12º são uma misturada de “Astrofísica”, “Cosmologia”, “Astronomia”, “Meteorologia”, etc. etc. Fala-se da vida de cientistas famosos, das alterações climáticas, das Nebulosas, da constituição da Luz, do Campo Electromagnético, etc.. Metem-se poemas dentro de Manuais de Física! Divaga-se sobre planeamento de investigações complicadas e de instrumentos maravilhosos, etc. etc. Pelo meio desse emaranhado lá aparecem, timidamente, as Leis de Newton e de Lavoisier, (mas não a de Proust), Lei d’Ohm e outras também fundamentais.
Este tipo de Ensino(?) é completamente alheio noutros países: consultando livros de texto (College ou General Physics e College ou General Chemistry) de cursos do mesmo nível da cena internacional, nada se encontra semelhante aos fantasiosos programas de Física e Química para o Ensino Básico e Secundário deste País!
Além disso, a matéria está mal ordenada: chega-se a ensinar aos alunos o cálculo do rendimento de uma máquina antes de lhes ensinar os conceitos de trabalho de uma força e de potência e respectivos tipos de unidades usuais. Também não há coordenação entre os programas de Físico-Químicas do 7º. ao 9º e os de Física e de Química do 10º ao 12º.
No Básico, e até no Secundário, as matérias são dadas de um ponto de vista “jornalístico”, não de um ponto de vista científico. Tudo com um carácter fantasioso, não como matéria séria e útil para aplicações concretas na vida real, embora a esta se faça profusa referência.
E os programas de Matemática não estão muito melhores. Tem-se a absurda pretensão de dar no secundário grande parte do que é próprio do superior, nomeadamente cálculo diferencial e funções de variável complexa. A situação é tanto mais absurda quanto a escolaridade da disciplina é baixa (2 aulas por semana) do 5º ao 12º ano e, além disso, aos alunos do 1º até ao 4º ano quase nada é ensinado de matemática (como, aliás das outras matérias: Língua Portuguesa, História, Ciências Naturais, etc.)
Depois, um tanto como em Físico-Químicas, a confusão é enorme: A “Estatística” é dada em todos os anos do 5º ao 12º! . A Trigonometria é dada no Básico (9ºano) e volta a ser dada no Secundário! Também as Sucessões, Limites, etc., são dados “às fatias” em mais do que um ano!
Na Geometria faz-se uma baralhada, não se distinguindo claramente Geometria Elementar no Plano e no Espaço tridimensional, da Geometria Analítica que é assunto bem diferente. A Geometria Elementar no Plano e no espaço começa a ser dada no Básico (5º ao 9ºano) e volta a ser dada no Secundário! Há até um pormenor curioso, que mostra bem a desorientação: o 5º ano de Matemática inicia-se com “Planificação de Sólidos: prismas, pirâmides, cilindros e cones” quando ainda nada foi dado aos alunos de Geometria Elementar no Plano! No que diz respeito a desenhos ilustrativos a realizar à mão livre, que são altamente formativos, e cálculos numéricos, também à mão ou com máquinas vulgares, não são incentivados e obrigam-se os alunos a adquirir de calculadoras com a capacidade de traçar gráficos de algumas funções. Porém, contraditoriamente proíbem-se os alunos de usar essas mesmas calculadoras ou outras muito mais baratas para fazer o cálculo numérico de funções, determinando, em particular, os limites das mesmas quando a variável independente tende para um certo valor (por ventura zero ou infinito) ! E alguns professores acrescentam que esses tratamentos numéricos são próprios das Engenharias e eles, professores, se formaram em Matemáticas Puras, nada tendo a ver com a Engenharia...

JBM (Nov. 2010)
-
[Continua]

Sem comentários: