No jornal de parede electrónico de que sou editor (Universidade Alternativa) publiquei há poucos semanas uma nota sobre a temática da composição da assembleia estatutária da Universidade do Minho em que assinalava a curiosidade de haver um membro externo da dita assembleia que está, simultaneamente, na assembleia congénere da Universidade do Porto. Perante este facto, ironizando, questionava se os elementos externos que integram as assembleias estatutárias não deveriam ser todos os mesmos. Assim se poupariam muitos esforços e tempo.
Esta nota surgia na continuidade de uma primeira, da autoria de um colega, que, no seu blogue (Empreender), havia questionado o facto identicamente curioso de uma assembleia estatutária constituída ao abrigo da lei nº 62/2007 (RJIES) poder integrar entre os seus membros, com o estatuto de membro externo, isto é, cooptado, um ex-reitor da Instituição. Uma vez mais a título de comentário irónico, essa situação levou-me então a questionar se não seria esta uma política de recrutamento dos membros externos a manter aquando da constituição do futuro Conselho Geral. Assim se evitaria o desperdício de capital de experiência que a não preservação dessa prática implicaria.
Lembre-se que a lei estabelece sobre a constituição das assembleias estatutárias, à semelhança dos futuros conselhos gerais (órgãos de topo da instituições, responsáveis, nomeadamente, pela designação dos reitores ou presidentes), que aquelas integram, obrigatoriamente, “Cinco personalidades externas de reconhecido mérito não pertencentes à instituição com conhecimentos e experiência relevante para a instituição.”
A manifesta interpretação “desviante” do espírito da lei que aqui invoco estará longe de ser caso isolado. Na sua crueza, este exemplo serve para tornar patente quanto intenções de reforma que aparecem suportadas na produção de leis e na suposta clarividência do legislador (ou do príncipe) facilmente falham no seu alcance. Por isso, durante a fase de discussão da lei, falei da necessidade de se trazer para o processo os agentes da reforma necessária, professores, investigadores, técnicos que suportam o funcionamento das instituições, e também alguns interlocutores daquilo que deveria ser o caminho a trilhar pelas Instituições de Ensino Superior em matéria de relação com a comunidade. Possivelmente, só não deixei um alerta tão forte quanto deveria para o perigo, óbvio, da oligarquia de interesses que estava (está) instalada se assenhorear do processo. O perigo que se oferecia era que desembocássemos numa situação em que, parecendo que alguma coisa mudaria, ficasse tudo na mesma. O exemplo que deixo acima ilustra a verosimilhança desse risco.
Não é, entenda-se, que as personalidades em causa não sejam pessoas de grandes méritos e com contributos dados à Universidade dignos de reconhecimento. O problema é que deveriam ter tido a lucidez de se afastarem neste momento que deveria ser de renovação, e deviam tê-lo feito apesar de (ou sobretudo se) pressionadas a continuarem, porque essa pressão só poderia vir de quem não é capaz de replicar-lhes a obra e delas se serve como bóia para se manter à tona da água.
A inércia que persiste e a falta de ousadia que é patente têm ilustração também na forma como as instituições estão a reagir à possibilidade consagrada na lei de optarem pelo estatuto de fundações públicas de direito privado. Tratando-se, embora, de uma figura estatutária opaca, inventada por uma tutela animada de intenções ainda mais opacas, a verdade é que ninguém antecipava o que viria a passar-se, incluindo a postura que Vasco Eiriz, o colega a que fiz já alusão a abrir este texto, designou de posição de “Maria vai com todas”, e que eu chamaria antes de “Maria vai com as outras”. Esta figura de estilo é usada para sublinhar uma conduta em que ninguém quer arriscar, ficando todos à espera do passo que dê a “vizinha”. Daqui resulta que tanto a fundação aparece recusada por todos(as) quanto conquista a respectiva adesão. Depois de Aveiro, o ISCTE e o Porto, à última hora, terem dado o primeiro passo, vamos poder confirmar isso nos próximos meses.
Tudo o que se anota aqui é tanto mais paradoxal quanto a sociedade espera do Ensino Superior, crescentemente, liderança, iniciativa e inovação. Ora se, como anotava José Manuel Silva no seu blogue (Campo Lavrado), em entrada já deste ano, todo o líder deve possuir “curiosidade, criatividade, comunicação, carácter, coragem, convicção e carisma", temos que convir que não é isto que transpira desta reforma do ensino superior nacional, quer em termos da iniciativa que a desencadeou formalmente, quer em termos do processo de implementação que está a ter.
Esta nota surgia na continuidade de uma primeira, da autoria de um colega, que, no seu blogue (Empreender), havia questionado o facto identicamente curioso de uma assembleia estatutária constituída ao abrigo da lei nº 62/2007 (RJIES) poder integrar entre os seus membros, com o estatuto de membro externo, isto é, cooptado, um ex-reitor da Instituição. Uma vez mais a título de comentário irónico, essa situação levou-me então a questionar se não seria esta uma política de recrutamento dos membros externos a manter aquando da constituição do futuro Conselho Geral. Assim se evitaria o desperdício de capital de experiência que a não preservação dessa prática implicaria.
Lembre-se que a lei estabelece sobre a constituição das assembleias estatutárias, à semelhança dos futuros conselhos gerais (órgãos de topo da instituições, responsáveis, nomeadamente, pela designação dos reitores ou presidentes), que aquelas integram, obrigatoriamente, “Cinco personalidades externas de reconhecido mérito não pertencentes à instituição com conhecimentos e experiência relevante para a instituição.”
A manifesta interpretação “desviante” do espírito da lei que aqui invoco estará longe de ser caso isolado. Na sua crueza, este exemplo serve para tornar patente quanto intenções de reforma que aparecem suportadas na produção de leis e na suposta clarividência do legislador (ou do príncipe) facilmente falham no seu alcance. Por isso, durante a fase de discussão da lei, falei da necessidade de se trazer para o processo os agentes da reforma necessária, professores, investigadores, técnicos que suportam o funcionamento das instituições, e também alguns interlocutores daquilo que deveria ser o caminho a trilhar pelas Instituições de Ensino Superior em matéria de relação com a comunidade. Possivelmente, só não deixei um alerta tão forte quanto deveria para o perigo, óbvio, da oligarquia de interesses que estava (está) instalada se assenhorear do processo. O perigo que se oferecia era que desembocássemos numa situação em que, parecendo que alguma coisa mudaria, ficasse tudo na mesma. O exemplo que deixo acima ilustra a verosimilhança desse risco.
Não é, entenda-se, que as personalidades em causa não sejam pessoas de grandes méritos e com contributos dados à Universidade dignos de reconhecimento. O problema é que deveriam ter tido a lucidez de se afastarem neste momento que deveria ser de renovação, e deviam tê-lo feito apesar de (ou sobretudo se) pressionadas a continuarem, porque essa pressão só poderia vir de quem não é capaz de replicar-lhes a obra e delas se serve como bóia para se manter à tona da água.
A inércia que persiste e a falta de ousadia que é patente têm ilustração também na forma como as instituições estão a reagir à possibilidade consagrada na lei de optarem pelo estatuto de fundações públicas de direito privado. Tratando-se, embora, de uma figura estatutária opaca, inventada por uma tutela animada de intenções ainda mais opacas, a verdade é que ninguém antecipava o que viria a passar-se, incluindo a postura que Vasco Eiriz, o colega a que fiz já alusão a abrir este texto, designou de posição de “Maria vai com todas”, e que eu chamaria antes de “Maria vai com as outras”. Esta figura de estilo é usada para sublinhar uma conduta em que ninguém quer arriscar, ficando todos à espera do passo que dê a “vizinha”. Daqui resulta que tanto a fundação aparece recusada por todos(as) quanto conquista a respectiva adesão. Depois de Aveiro, o ISCTE e o Porto, à última hora, terem dado o primeiro passo, vamos poder confirmar isso nos próximos meses.
Tudo o que se anota aqui é tanto mais paradoxal quanto a sociedade espera do Ensino Superior, crescentemente, liderança, iniciativa e inovação. Ora se, como anotava José Manuel Silva no seu blogue (Campo Lavrado), em entrada já deste ano, todo o líder deve possuir “curiosidade, criatividade, comunicação, carácter, coragem, convicção e carisma", temos que convir que não é isto que transpira desta reforma do ensino superior nacional, quer em termos da iniciativa que a desencadeou formalmente, quer em termos do processo de implementação que está a ter.
J. Cadima Ribeiro
(artigo de opinião publicado na edição de hoje do Jornal de Leiria)
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