«Na Faculdade de Arquitectura de Lisboa, um esclarecedor exemplo do chocante confronto entre dois caminhos para superar os problemas nacionais
Numa altura em que ministro da Educação e reitores das universidades Técnica e Clássica de Lisboa apadrinham o que chamam de uma fusão entre elas, 36 professores convidados da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa foram contactados, nos últimos dias, pelo presidente desta mesma faculdade, eleito há apenas duas semanas, e por directa instigação do reitor da Técnica, a rescindirem os seus contratos, ou seja, a despedirem-se a si próprios, sem qualquer indemnização.
Seria esta a forma, segundo o referido presidente, de salvar a faculdade e sanear o seu défice financeiro acumulado em anos recentes e orçado em 800 mil euros.
Entre aqueles 36 professores, há inúmeros que o são, ali, há dezenas de anos, conduzindo e leccionando cadeiras por onde passaram centenas de alunos, apesar de terem sempre sido contratados a prazo, coisa que, como é sabido, é ilegal para o sector privado mas a que o Estado se arroga para permitir, nomeadamente, deploráveis situações como esta.
O referido despedimento, para além da destruição de inúmeras carreiras académicas, reduziria a condições quase inoperacionais cursos como os de design, design de moda ou cenografia, e teria, também, nefastas consequências no curso de arquitectura e em toda a instituição. E, tudo isto, numa que remonta ao século XVI e que teve a sua última formulação moderna em 1979, por onde passaram enormes vultos das respectivas áreas.
Evidentemente que não espero surpreender o leitor com mais 36 despedimentos, num País onde eles já ultrapassam, e muito, o milhão de cidadãos.
Mas o que aqui está envolvido é algo que interessa ao País.
Primeiro, emerge na Faculdade de Arquitectura o que já é bem patente em muitos outros sectores. Em vez de nos unirmos, a sério, num esforço colectivo, solidário e mobilizador da superação dos problemas nacionais, nomeadamente os financeiros, por todos repartido equitativamente, escolhem-se os mais fracos, os mais frágeis, e carrega-se sobre eles as medidas mais desumanas e castradoras.
Em segundo lugar, expressa-se, já, na Faculdade de Arquitectura, o que alguns, como o ministro da Educação e o reitor da Universidade Técnica, entendem ser a fusão das universidades. Um excelente pretexto para despedir (ou então, naquele incrível eufemismo, de serem as pessoas a despedir-se a si próprias) e desactivar instituições credíveis e sustentáveis pelo muito e bom trabalho que desenvolveram.
Farão bem os professores de todas as faculdades e escolas envolvidas, inclusive o reitor da Universidade Clássica, em olhar para a brutalidade do que está a acontecer na Faculdade de Arquitectura e em reflectir sobre uma política que lança apenas uma corda a que alguns se agarrarão, por oportunismo ou arbitrariedade, mas em que muitos, e muito injustamente, ficarão de fora e cairão nas chamas do desemprego e do sofrimento. Em combustão.»
Carlos Oliveira Santos
Professor Convidado da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa
(reprodução de artigo de opinião Económico online, de 18 Março 2012)
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[cortesia de Nuno Soares da Silva]
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