“Adeus tristeza. Viva 1997!”
“É habitual nesta ocasião proceder-se ao balanço do ano findo. Não querendo ir contra a tradição, também eu me proponho, nesta edição, proceder à eleição dos mais e dos menos de 1996, quer dizer, dos acontecimentos e dos personagens que mais cativaram a minha atenção, se bem que nem sempre pelas melhores razões.
A listagem é comprida, pelo que a economia de esforço e a gestão criteriosa de espaço no jornal obrigam-me a ser parco na justificação dos destaques.
Seguindo o velho princípio, cultivado no cinema e nas telenovelas, de reservar para o último episódio as boas novas, isto é, o casamento do herói com a princesa e a reconciliação das famílias desavindas, começarei pela nomeação dos destaques de sinal menos. A esse título retenho:
i) a prestação medíocre do Partido Socialista e do Eng.º Guterres no seu primeiro ano de governo; em razão disso, temo o pior pelo que se reporta ao segundo;
ii) a postura do eleitorado que votou Guterres que, colocado perante a evidência de um governo sem arte nem saber, se recusa a admitir que só as moscas mudaram (pelo menos, a atentar nas sondagens eleitorais);
iii) o comportamento desbocado e deslocado do Dr. Mário Soares, permanentemente disponível para falar do que não sabe e fazer corpo com amigos da onça, chame-se ela como se chamar;
iv) o despudor do Prof. Cavaco Silva que, de cima do seu altar de pretensão, descorre sobre a regionalização e sobre o mundo com o mesmo à-vontade com que no passado afirmou que nunca se enganava. Assemelha-se nisso muito ao seu conviva dos velhos tempos de governo, o Dr. Mário Soares;
v) a desventura de Diana de Inglaterra, que não vai descalça mas nem por isso vai mais segura (pelo que se afigura, o tempo não vai de feição para príncipes e princesas, daí talvez a afirmação de que a tradição já não é o que era);
vi) a prestação miserável do PSD de Braga, ao falhar mais uma vez a oportunidade de concorrer à Câmara Municipal de Braga; depois vão admirar-se que alguém diga que mantêm um pacto secreto com o Engº Mesquita Machado para a perpetuação deste no poder;
vii) a desvergonha de um PIDDAC para 1997 que esconde o eleitoralismo rasteiro sob o manto diáfano da ausência de estratégia para o país (contra a força da ideia de que «mama quem berra», que vi proposta num jornal de Leiria, o que marca presença mesmo é a bajulação miudinha dos votos dos eleitores de Lisboa e Porto);
viii) a navegação à vista do Presidente da Câmara Municipal de Braga, bem evidenciada no caos em que se transformou o trânsito citadino e na procura de resolução sobre pressão dos acontecimentos e da peleja que se aproxima; obviamente que o Eng.º Mesquita Machado sempre poderá queixar-se da falta de civismo dos habitantes da urbe, mas estou em crer que os demais portugueses não serão menos bárbaros que os bracarenses;
ix) a infelicidade da Rute, que se deixou levar pela cantiga do bandido e se vê agora obrigada a vender por boa a paixão de António Guterres pela educação.
Os destaques mais, como seria de prever, são bem menos. Não fora assim e as novas seitas e religiões teriam muito menos cultores; presumo que o mesmo sucederia com as mais antigas. Seja como for, assinale-se a esse título:
i) o razoável comportamento do ano económico, pese embora o governo socialista tudo tenha feito para que a dinâmica económica não fosse além da prestação do próprio governo; fica-se na dúvida, nas presentes circunstâncias, se não seria mais benéfico para a evolução do PIB a ausência de gestão administrativa pública;
ii) o descrédito em que caíram alguns dos «senhores do Norte»: Fernando Gomes, Narciso Miranda, Ludgero Marques; tal qual como acontece com as senhoras quando se baixam, também neste caso tudo ficou mais à vista quando, para se fazerem ouvir, tiveram que passar a usar os bicos dos pés;
iii) o alvorecer de um novo ano, que sempre permite recriar a ideia, ingénua, que neste ano tudo vai ser diferente; quer dizer, desta vez é que é para valer: adeus tristeza!”
J. C.
(reprodução integral de texto do autor identificado, publicado no jornal Notícias do Minho, em 97/01/10, em coluna regular intitulada “Crónicas de Maldizer”)
“É habitual nesta ocasião proceder-se ao balanço do ano findo. Não querendo ir contra a tradição, também eu me proponho, nesta edição, proceder à eleição dos mais e dos menos de 1996, quer dizer, dos acontecimentos e dos personagens que mais cativaram a minha atenção, se bem que nem sempre pelas melhores razões.
A listagem é comprida, pelo que a economia de esforço e a gestão criteriosa de espaço no jornal obrigam-me a ser parco na justificação dos destaques.
Seguindo o velho princípio, cultivado no cinema e nas telenovelas, de reservar para o último episódio as boas novas, isto é, o casamento do herói com a princesa e a reconciliação das famílias desavindas, começarei pela nomeação dos destaques de sinal menos. A esse título retenho:
i) a prestação medíocre do Partido Socialista e do Eng.º Guterres no seu primeiro ano de governo; em razão disso, temo o pior pelo que se reporta ao segundo;
ii) a postura do eleitorado que votou Guterres que, colocado perante a evidência de um governo sem arte nem saber, se recusa a admitir que só as moscas mudaram (pelo menos, a atentar nas sondagens eleitorais);
iii) o comportamento desbocado e deslocado do Dr. Mário Soares, permanentemente disponível para falar do que não sabe e fazer corpo com amigos da onça, chame-se ela como se chamar;
iv) o despudor do Prof. Cavaco Silva que, de cima do seu altar de pretensão, descorre sobre a regionalização e sobre o mundo com o mesmo à-vontade com que no passado afirmou que nunca se enganava. Assemelha-se nisso muito ao seu conviva dos velhos tempos de governo, o Dr. Mário Soares;
v) a desventura de Diana de Inglaterra, que não vai descalça mas nem por isso vai mais segura (pelo que se afigura, o tempo não vai de feição para príncipes e princesas, daí talvez a afirmação de que a tradição já não é o que era);
vi) a prestação miserável do PSD de Braga, ao falhar mais uma vez a oportunidade de concorrer à Câmara Municipal de Braga; depois vão admirar-se que alguém diga que mantêm um pacto secreto com o Engº Mesquita Machado para a perpetuação deste no poder;
vii) a desvergonha de um PIDDAC para 1997 que esconde o eleitoralismo rasteiro sob o manto diáfano da ausência de estratégia para o país (contra a força da ideia de que «mama quem berra», que vi proposta num jornal de Leiria, o que marca presença mesmo é a bajulação miudinha dos votos dos eleitores de Lisboa e Porto);
viii) a navegação à vista do Presidente da Câmara Municipal de Braga, bem evidenciada no caos em que se transformou o trânsito citadino e na procura de resolução sobre pressão dos acontecimentos e da peleja que se aproxima; obviamente que o Eng.º Mesquita Machado sempre poderá queixar-se da falta de civismo dos habitantes da urbe, mas estou em crer que os demais portugueses não serão menos bárbaros que os bracarenses;
ix) a infelicidade da Rute, que se deixou levar pela cantiga do bandido e se vê agora obrigada a vender por boa a paixão de António Guterres pela educação.
Os destaques mais, como seria de prever, são bem menos. Não fora assim e as novas seitas e religiões teriam muito menos cultores; presumo que o mesmo sucederia com as mais antigas. Seja como for, assinale-se a esse título:
i) o razoável comportamento do ano económico, pese embora o governo socialista tudo tenha feito para que a dinâmica económica não fosse além da prestação do próprio governo; fica-se na dúvida, nas presentes circunstâncias, se não seria mais benéfico para a evolução do PIB a ausência de gestão administrativa pública;
ii) o descrédito em que caíram alguns dos «senhores do Norte»: Fernando Gomes, Narciso Miranda, Ludgero Marques; tal qual como acontece com as senhoras quando se baixam, também neste caso tudo ficou mais à vista quando, para se fazerem ouvir, tiveram que passar a usar os bicos dos pés;
iii) o alvorecer de um novo ano, que sempre permite recriar a ideia, ingénua, que neste ano tudo vai ser diferente; quer dizer, desta vez é que é para valer: adeus tristeza!”
J. C.
(reprodução integral de texto do autor identificado, publicado no jornal Notícias do Minho, em 97/01/10, em coluna regular intitulada “Crónicas de Maldizer”)
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Comentário: memória de um tempo triste, para que não julguemos tristes apenas os tempos que atravessamos; não torna os nossos dias menos tristes. É verdade!