«Pode dizer-se que é curta a experiência de montar e liderar um grupo de trabalho virado para a construção de análises e explicações, e não é grande a prática de ensino com total disponibilização de tempo do professor, a todo o momento, para se encontrar com o grupo e discutir ensinando, mas também, conjuntamente descobrindo. E é isso que se impõe com o processo de Bolonha.
Isto leva-me a pensar, que a adopção do Processo de Bolonha, com todos os méritos que arrasta, sem dúvida, e acreditando na motivação geralmente apresentada para a sua generalização na União Europeia, a maior facilidade de intercomunicação e de transferência de competências entre estados membros, talvez careça de uma preparação intelectual de uma boa parte das elites universitárias e, sem dúvida alguma, uma aprendizagem dos docentes "viciados" no sistema clássico.
São muitas as questões que se levantam neste tipo de preocupação e que o nosso sistema de ensino deixa a descoberto. Uma delas diz respeito à consagração do modelo de aulas tuteladas, onde a forma pedagógica de actuar é bastante diferente da forma clássica da aula teórica, mas também da aula prática. O professor integra-se num grupo de trabalho e com ele, liderando-o e coordenando as suas tarefas e a sua interacção, vai acompanhando o grupo, até à produção de um produto final. E tudo isso está interligado com uma nova forma de classificar o aluno, sendo a classificação permanente e baseada, muito mais do que até agora, no contacto com o aluno, observando a sua performance e a sua atitude perante a questão de descobrir respostas e soluções para os problemas que lhe vão surgindo. O papel e a responsabilidade do professor aumentam significativamente neste contexto.
Talvez mais impressionante, é a alteração exigida na mentalidade e na percepção dos alunos quanto às matérias que lhes cabe estudar. A clássica observação "o professor não deu esta matéria", observação que se exaltava não poderá ser invocada. A matéria, tal como até aqui, será objecto de um programa aprovado e publicamente conhecido. Mas não há fronteiras estritas no que toca ao âmbito de cada tema que tal programa enuncie. Poderá mesmo imaginar-se que, em muitos casos haverá uma negociação tácita sobre os limites de âmbito de cada tema. O que tal implica é que o diálogo entre professor e aluno será muito superior ao actual. O professor lança temas como desafio aos alunos, em pequenos grupos e, com eles, investigando bibliograficamente, via Internet ou em fontes de todo o tipo, procura chegar a conclusões e portanto a autênticas "pequenas teses" sobre os temas objecto do desafio.
Daqui resultam as indeclináveis perguntas. Será que os nossos professores estão preparados para este tipo ou esta nova forma de ensinar? Será que temos tudo preparado para um programa de treino e aprendizagem dos próprios professores universitários mais clássicos, para este tipo de actuação?
Esta é apenas a ponta de um icebergue que terá por baixo de si questões ainda mais preocupantes, como sejam: o que significa uma licenciatura de três anos e que relação têm com os antigos bacharelatos? Que ligação têm os mestrados previstos com as licenciaturas enunciadas? Como vai o mercado reagir no que toca à procura de licenciados e de mestres? Será que o doutoramento é, não apenas um grau e uma fase da carreira docente, mas também, visto pelo mercado, uma graduação suplementar e desejável ou mesmo pagável de um licenciado ou mestre que se pretende mais competente e portanto distinguido pela procura do mercado como tal?»
Bernadette Cunha
(mensagem datada de 06/12/07, disponível no blogue de apoio à unidade curricular Economia Portuguesa , da EEG/UMinho; http://economiaportuguesa.blogspot.com)
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