Por estes dias, os jornais e a comunicação social, de uma forma geral, têm estado cheios de notícias sobre a reforma do ensino superior ou, pelo menos, sobre o projecto de "Novo regime jurídico das instituições do ensino superior", aprovado por Conselho de Ministros extraordinário realizado em Évora, no dia 5 de Maio pp.
Não questionando a pertinência de uma profunda reforma do ordenamento e do modelo de organização e de funcionamento das instituições de ensino superior, confesso que fico sempre desconfortável quando sou confrontado com tamanho espectáculo mediático e barreira propagandística, construídos em torno da aprovação pelo decisor político de um pacote legislativo ou de uma qualquer tomada de decisão que, supostamente, se pretende de maior alcance. O desconforto é tanto maior quanto, em comunicado produzido quatro dias depois por um dos sindicatos do sector, se podia ler que, “Contactado o Senhor Chefe do Gabinete do Ministro da Ciência, tecnologia e Ensino Superior, fomos informados que o texto que circula não corresponde à última versão, e que esta se não encontra fechada, havendo a intenção de a enviar aos parceiros educativos.”(SNESup, 07/05/08). Prosseguindo o texto com a afirmação, que subscrevo na integra, que “Andaria bem o Senhor Ministro em enviar o texto oficial aos parceiros educativos, inclusive aos Sindicatos, e dedicar algumas horas do seu tempo a discutir com eles este documento, […]”.
Tratando-se da reforma do ensino superior ou da reforma da Administração pública, de que também se tem falado muito nos últimos meses (e há-de continuar a falar-se), defendo que há princípios informadores que são iniludíveis e que farão a diferença entre o precário, o casuístico, e o duradouro. Entre esses princípios encontram-se:
i) a aposta na qualificação dos serviços prestados aos cidadãos e às empresas, ao invés da redução de custos como fim;
ii) um pensamento informador da reforma fundado nas necessidades sentidos e nas metas visadas, e não no efeito de curto-prazo que anúncios demagógicos possam provocar na opinião “publicada”;
iii) a assumpção das reformas como peças de aproximação da administração (das estruturas prestadoras de serviços, de ensino ou outras) dos cidadãos e de democraticidade, o que só será efectivo através da desconcentração e descentralização de poder e de competências nos níveis local e regional; e
iv) a interiorização clara no quadro institucional da reforma de que as pessoas e a sua motivação são os elementos centrais da eficiência do funcionamento das organizações, e sem elas não é possível construir qualquer projecto de qualificação dos serviços prestados à sociedade.
Por tudo isso, sublinho, não entendo porque a informação relevante sobre o processo de revisão legal respeitante ao ensino superior anunciada não ficou imediatamente acessível aos actores relevantes do sector e, até, ao cidadão comum. E entendo legitimo que aqueles se sintam desconsiderados, tanto mais quanto foram e continuam patentes densas barreiras de nevoeiro mediático em torno do projecto anunciado.
Este destacar das opacidade, manipulação da opinião pública e relativo autismo que vem caracterizando a acção do MCTES (Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) e, por conseguinte, do respectivo ministro, teve expressão clara na forma como, no ano precedente, foi lançada a reestruturação dos cursos do ensino superior, para os adequar à chamada Declaração de Bolonha.
Nessa altura, o MCTES falhou sem apelo nem agravo, libertando tardiamente os enquadramentos legais e veiculando de forma atabalhoada as orientações de procedimento que importava transmitir às instituições de ensino superior.
Procedendo como o vem fazendo, o ministro, que é Gago, vem dando razão aos que nunca o acharam com perfil adequado (já não falo de isenção pessoal) para tutelar o ensino superior. Acresce que muito do que vem sendo feito aparenta ser mais ditado por imperativos de natureza orçamental que por óbvios desígnios de resposta às exigências de modernização da nossa economia e sociedade.
J. Cadima Ribeiro
(Artigo de Opinião publicado no Jornal de Leiria, em 07/05/17)
1 comentário:
Ora,nem mais,o que o J. Cadima Ribeiro aqui disse é o que precisa mesmo de ser dito.
Pessoalmente, entendo bem que estamos em época que exige graves restrições orçamentais; mas, quem deve decidir, e pronunciar-se sobre estes temas, é apenas sua excelência, o Senhor Ministro das Finanças, ouvidos os seus pares de governação.
Para mim, o MCTES, precisaria apenas de gerir bem, e aplicar o melhor que pudesse - em comum, e em simultaneo, com TODOS os parceiros de Educação Terciária, Ciência e Tecnologia - as deficiências orçamentais do sector, que todos sabemos serem muito difíceis de ultrapassar.
O problema dele, para mim, é - agora, mas sempre o "conheci" assim - querer assumir, exclusiva e simultaneamente, as funções DECISÓRIAS (não as Responsabilidades)do Ministro dos Negócios Estrangeiros, do Ministro da Economia, de cientista de bancada, dos Reitores, do empresáriado (pseudoprivado) de base tecnológica, do investidor privado mas com recursos públicos, de juíz de fiscal de linha das formações terciárias,etc.etc.
É só por isso, que demonstra dificuldades de executar o que precisaria fazer, minimizando, naturalmente, o descontentamento de todos, que em épocas como estas, valha a verdade, também é de se esperar, faça-se o que se fizer. Mas...
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